quarta-feira, 30 de março de 2016

[HQlist] Detetives

Um dos seguimentos mais tradicionais dos quadrinhos, as histórias de detetives tratam-se de um filão que ainda não chegou ao esgotamento. Assim como na literatura policial contamos com grandes personagens como Hercule Poirot (criação de Agatha Cristie) e Detetive Maigret (de George Simenon), nas HQs também temos grandes detetives, de facetas tão díspares e interessantes que vale fazer uma lista mencionando alguns deles.


Wesley Dodds e seu alter ego, Sandman, é um dos personagens mais antigos da DC Comics, tendo estreado na revista Adventure Comics #40 de julho de 1939, ou seja, muito tempo antes de Neil Gaiman criar ao lado Sam Kieth o personagem de mesmo nome, mas com essência diferente. O Sandman da Era de Ouro, como é também conhecido, é um misterioso detetive que usa máscara e arma de gás enquanto está em ação, uma vez que prefere colocar seus algozes para dormir ao invés de entrar em combate direto. O personagem somente se tornou conhecido atualmente em razão da série Sandman Teatro do Mistério escrita por Matt Wagner no selo Vertigo durante os anos 90. Em sua versão moderna, Dodds é um cara comum, valendo-se apenas de seu intelecto, coragem e da arma de gás durante suas investigações.


Para muitos ele é o mais famoso detetive dos quadrinhos. Certamente ele é um dos mais antigos. Dick Tracy foi criado em 1931 por Chester Gould nas página do jornal Chicago Tribune, de onde se proliferou para mais de 800 jornais ao redor do mundo, atingindo uma marca aproximada de 150 milhões de leitores. Dick Tracy ostenta todas as qualidade pelas quais os detetives hoje são reconhecidos: inteligência acima do comum, sofisticada perícia com armas e habilidoso no combate corpo a corpo. Sem falar no visual, com seu sobretudo e chapéu amarelos que marcaram época. O sucesso do personagem atravessou gerações e hoje é tido como um dos ícones da cultura pop americana. A série durou até 1977.



Rivalizando com Sandman Teatro de Mistérios na característica ambientação noir está Blacksad. Criação de Juan Díaz Canales e Juanjo Guarnido, Blacksad se encaixaria perfeitamente dentro do esteriótipo de detetive particular, se não fosse por uma peculiaridade: possuir a forma antropomorfizada de um gato. Essa é marca registrada da obra dos autores espanhóis, que prezam pelo apurado vigor artístico de seu roteiro (Canales) e da arte (Guarnido). Atualmente, Blacksad protagonizou cinco álbuns, sendo apenas os dois primeiros lançados no Brasil (pela Panini).



Dylan Dog é o detetive do sobrenatural e é provavelmente o que mais recebe casos bizarros dentre os integrantes dessa lista. Seus clientes querem geralmente se livrar de uma assombração que os persegue ou se livrar de alguma maldição de que não consegue se livrar. Trata-se de um dos personagens mais famosos da Bonelli Editore, tanto que em 2011 foi adaptado para os cinemas, sem, infelizmente, ter atingido a qualidade esperada. Dylan Dog é uma criação de Tiziano Sclavi.


Esse detetive dispensa maiores apresentações. Embora seu perfil detetivesco esteja meio em baixa, ele nunca deixou de existir em suas histórias, ainda que tangencialmente. Dotado de extrema inteligência e preparo físico, Bruce Wayne ainda possui de recursos financeiros quase ilimitados para se equipar das mais diversas quinquilharias, que aparentemente não possui nenhuma utilidade, não até Batman se valer nelas num preciso momento e lugar. Durante a Era de Ouro e Prata dos quadrinhos, Batman era, de fato, um detetive. Suas tramas era focadas nesse aspecto. Somente com a ascensão da Marvel e do conceito de super-heroísmo pelos qual conhecemos hoje é que Batman mudou.

sexta-feira, 18 de março de 2016

"A Máquina de Goldberg" retrata drama do bullying na adolescência


Sabe aquelas geringonças mirabolantes construídas para realizar um simples ato, passando por uma infinidade de estágios conectados entre si, podendo incluir desde um gato se espreguiçando até o acionamento de uma ampulheta? Então, esse sistema é conhecido como máquina de Goldberg e é de importância central para o quadrinho de mesmo nome escrito pela jornalista Vanessa Barbara e pelo ilustrador Fido Nesti.

A obra conta o típico drama de um adolescente que sofre bullying. O alvo das gozações é Getúlio, que parece incorporar todas aquelas clássicas característica de um garoto impopular. O seu suplício aumenta quando ele e sua turma de colégio vão passar uma temporada num acampamento de verão, ironicamente chamado de "Montanha Feliz". Lá ele é posto em várias situações constrangedoras que agravam sua situação. 

Foi com o zelador do acampamento que Getúlio conhece os aparatos que dão nome ao álbum. Para que simplificar uma ação se podemos complicá-la? O singelo ato de fechar uma porta se transforma em um processo de 17 estágios, que inclui um fole-assoprador inflando uma bexiga, fazendo que a bola que se repousava sobre ela seja lançado sobre uma canaleta... e assim vai, até a porta ser finalmente fechada. Quanto mais complexo e demorado for a sequência de atos, maior a façanha de seu criador. 

Essa peculiar forma de fazer as coisas foi uma criação do engenheiro e artista-plástico Rube Goldberg. Mais do que construir tais geringonças, Goldberg criou uma filosofia de vida. Uma vingança bem aplicada é aquela melhor elaborada, minuciosamente construída de maneira do resultado ser inevitável. Vemos claramente isso dentro da trama. Getúlio não verá tais máquinas como um mero escapismo para a perseguição que sofre, mas como uma ferramenta para combatê-la, uma esperança. 

Vanessa Barbara é uma proeminente escritora brasileira que já lançou alguns livros muito interessantes, como O Livro Amarelo do Terminal (seu primeiro grande trabalho, que lhe rendeu o Prêmio Jabuti de Reportagem), além de ser colunista da Estado de S. Paulo. Particularmente, sou muito fã do seu estilo de escrita. Seus textos quase sempre revelam o seu grande poder de observação, e ela sempre procura lançar uma visão curiosa do fenômeno retratado. Também vemos isso muito bem ao longo da trama. 

Fido Nesti divide a autoria da obra com Vanessa e é o responsável pela arte do álbum. Seus trabalhos incluem ilustrações para diversos veículos de comunicação brasileiros e estrangeiros e para obras como Lusíadas em quadrinhos (Peirópolis, 2006) e Loucas de Amor em quadrinhos (Ideias a Granel, 2009). 

Na presente obra, apesar dos desenhos estarem bem bacanas, não gostei do tom monocromático (levemente esverdeado). Além disso, creio que a opção de contar a história por meio de quadros menores, simetricamente divididos, fazendo pouco uso de tomadas panorâmicas, tenha deixado o ritmo de leitura pouco dinâmico. Talvez a limitação no número de páginas justifique o modelo adotado. Todavia, não se trata de algo que especialmente comprometa a obra.

Artigo originalmente publicado no Pipoca e Nanquim

A Máquina de Goldberg
*** 6,0
Quadrinhos na Cia. | novembro de 2012
Roteiro: Vanessa Barbara
Arte: Fido Nesti

sexta-feira, 11 de março de 2016

Eu li... Astro City Vol. 2 - Confissão

Astro City II #4-9 e 1/2 | Wildstorm (1996-1997) | Panini (set/2015) | Roteiro Kurt Busiek Arte Brent Anderson Arte-final Will Blyberg Cores Alex Sinclair

Astro City pode ser lido com pouco (ou nenhum) apego a continuidade, de forma que os arcos da série acontecem independentemente dos eventos das edições anteriores. Por isso, mesmo que você tenha perdido o primeiro encadernado Vida na Cidade Grande, você pode ler Confissão sem nenhum problema. Nessa história, vemos a trajetória de um clássico sidekick, bem à moda consagrada de Robin, só que mais questionador e incerto sobre seu papel no mundo. Busiek e Anderson diferenciam os seus personagens de seus congêneres, tornando-os profundos e diferenciados. Contar clássicas histórias de super-heróis sob uma perspectiva mais humana talvez seja um dos maiores méritos do quadrinho.

domingo, 6 de março de 2016

A arte de Sale e Stewart salta os olhos em "Cidade Eterna"


Na continuação dos eventos dos célebres arcos O Longo Dia das Bruxas Vitória Sombria, a dupla Jeph Loeb e Tim Sale novamente se junta para produzir essa minissérie em seis edições sobre a femme fatale de Batman. Apesar de não ser continuação direta dos eventos citados, Cidade Eterna retoma algumas pontas deixadas anteriormente e explora a busca de Selina Kyle sobre informações sobre seu passado.

No entanto, a história é facilmente apreensível pelo leitor ocasional, pois não exige grandes conhecimentos sobre cronologia, apesar de várias referências estarem presentes. Loeb nos trouxe aqui uma história divertida e interessante, acessível para quase todos os gostos. A história se inicia mostrando Selina Kyle desembarcando em Roma em companhia do Charada. A razão dos dois estarem juntos não são prontamente revelados, instigando a curiosidade do leitor. Vemos que Selina tem assuntos pendentes com a máfia italiana, pois o chefão do lugar tem muito a saber sobre a máfia de Gotham.

Esses acontecimentos são apresentados de uma forma bastante agradável e natural. Por mais que muita gente tenha bastante reserva em relação a Jeph Loeb, tem que se reconhecer que em Cidade Eterna ele foi muito hábil no que tange ao formato narrativo adotado. Aqui, a maior parte da ação está acompanhada da narração em terceira pessoa de Selina, permitindo uma abrangente compreensão e contextualização das cenas. Em certos momentos, o que poderia ser uma enfadonha cena, se torna algo cheio de significado. Nada foge do poder de observação e ironia da Mulher-Gato.

A arte merece considerações a parte. O resultado alcançado pela arte de Tim Sale e pela colorização de Dave Stewart é deslumbrante. A minissérie merece uma segunda leitura justamente em razão da arte diferenciada que permeia a obra. Por isso mesmo, ela preza por quadros maiores, por tomadas mais amplas, de forma que a história se escorasse de sobremaneira nas imagens. Sale não decepcionou nesse atributo. Além dos desenhos, a arte não seria a mesma sem as cores de Stewart, que se apoiou bastante nos efeitos de aquarela sobre os tons de cinza de Sale. 

Pode-se dizer, ao final, que Cidade Eterna foi um dos melhores quadrinhos de herói que tive o prazer de ler recentemente. Vale pela aventura (que apesar de enrolar um pouco, diverte muito), vale pela arte sob a batuta de Sale e Stewart.

Mulher-Gato: Cidade Eterna
Catwoman: When in Rome
***** 8,5
DC | novembro de 2004 a agosto de 2005
Panini Books | julho de 2012
Roteiro: Jeph Loeb
Arte: Tim Sale
Cores: Dave Stewart

quinta-feira, 3 de março de 2016

Eu li... Batman/Planetary: Noite Sobre a Terra

Planetary/Batman: Night on Earth | DC (ago/2003) | Panini (set/ 2015) | Roteiro Warren Ellis | Arte John Cassaday | Cores David Baron

Tinha como dar errado? Chamar Ellis e Cassaday para trazer Batman para o universo maluco e, ao mesmo tempo, familiar de Planetary só podia resultar num quadrinho fantástico. O espírito metalinguístico e autorreferencial da revista regular está todo aqui, só que dessa vez a dupla criativa tem 48 páginas só para se concentrar num dos maiores ícones da cultura pop do planeta: Batman. Desfilam pelas páginas da HQ várias versões do Cruzado Encapuzado através das décadas, de forma que temos a oportunidade de apreciar Cassaday (que já é um mestre) emulando a arte e o estilo de grandes artistas que desenharam o herói no passado, como Bob Kane, Carmine Infantino, Neal Adams, Dick Giordano, Frank Miller e Alex Ross.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Will Eisner foi figura central no movimento de fazer quadrinhos mais sérios e adultos


Se você tem algum conhecimento sobre a trajetória das histórias em quadrinhos através do tempo, certamente já deve se ter deparado com a informação de que Will Eisner, com a sua obra Um Contrato com Deus e Outras História de Cortiço, inaugurou a tradição das graphic novels. Aqui o termo é encarado como uma espécie de marco da transformação das HQ's de algo predominantemente voltado às crianças em algo de relevância artística. Seria como se os quadrinhos tivessem saído da adolescência e atingido a idade adulta e ganhado maturidade. 

Hoje, já se contesta muito se foi Eisner mesmo quem deu origem às narrativas gráficas, sobretudo se tivermos em vista o cenário dos quadrinhos europeus com a revista A Suivre e sua proposta de "bande dessinée adulte". Independentemente disso, é certo que Eisner inegavelmente foi um dos principais vetores do movimento graphic novel ao estampar essa expressão na capa de seu Um Contrato Com Deus, mesmo que ele não tenha alcançado a época grande sucesso. E esse tardio sucesso da obra se deve, pelo menos em parte, ao total desconhecimento da livrarias quanto ao material que tinham em mãos. Até que descobrissem, a obra foi alocado em seções tão díspares quanto literatura religiosa e publicações humorísticas

A obra consiste em quatro contos independentes que compartilham o mesmo ambiente: a Avenida Droopsie. Aliás, se levarmos em conta a ambientação, essa obra viria a formar uma trilogia com outras duas A Força da Vida (1988) e Avenida Droopsie: A Vizinhança (1995), que também se passam na mencionada avenida. Em todas elas, os becos e cortiços do lugar constituem um personagem autônomo, tão desenvolvido e profundo como qualquer outro. Mas em O Contrato com Deus o foco no ambiente é menor e Eisner centraliza suas atenções no elemento humano.

No conto "Um Contrato com Deus" acompanhamos a história de Frimme Hersh, cuja fé foi totalmente destruída por causa da morte de sua filha, pois Deus teria descumprido um contrato firmado com ele quando ele ainda era jovem. Enquanto Hersh dedicaria a sua vida para fazer o bem, Deus precisaria protegê-lo de todo o mal. Mas a tragédia com sua filha fez dele outra pessoa, transformando-o em uma pessoa amarga e aproveitadora. Esse novo estilo de vida fez dele um magnata, com dinheiro suficiente para prometer uma grande monta de dinheiro para uma sinagoga, em troco de os rabinos forjassem um novo contrato dele com Deus, dessa vez com a benção "oficial".

O que poucos sabem é que essa história é quase autobiográfica. Eisner a escreveu como uma forma de exorcizar os seus próprios demônios internos, uma vez que sua única filha morreu de leucemia aos 16 anos. Para ele, o conto serviu com uma forma de eliminar a "raiva contra uma divindade que eu acreditava que havia violado a minha fé" (CHUMACHER, Michael. Will Eisner: um sonhador nos quadrinhos. São Paulo: Globo, 2013).

Artisticamente, pode se escrever muito sobre o que representou a obra para os quadrinhos em geral. Para fins desse singelo texto, enfatizo a intenção de Eisner dar o máximo de unidade entre texto e imagem. Para tanto, empreendeu várias medidas como fazer muito uso de quadros sem borda, texto pendurado no próprio cenário (fazendo menos uso de balões), além de dispensar a colorização, fazendo com que texto e imagem tivessem a mesma identificação visual (reforçando a unicidade entre tais elementos). Para maiores informações sobre essa obra que é uma das mais fundamentais dos quadrinhos, recomendo fortemente a leitura do livro Will Eisner: um sonhador em quadrinhos, de Michael Chumacher.

Um Contrato com Deus e Outras Histórias de Cortiço
A Contract with God and Other Tenement Stories
***** 10
Baronet Books | outubro de 1978
Devir | maio de 2007
Roteiro e Arte: Will Eisner

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Eu li... Hulk Contra o Mundo

World War Hulk #1-5 | Marvel (2007-2008) | Salvat (nov/2014) | Roteiro Greg Pak | Arte John Romita Jr. | Arte-final Klaus Janson | Cores Christina Strain

Hulk Contra o Mundo é a continuação direta da aclamada Planeta Hulk, que contou a saga do Gigante Esmeralda após ser exilado no planeta Skaar, quando passou da condição de escravo a rei. Claro que o seu retorno à Terra não deixaria de ser publicado com pompa. Afinal, nunca o herói esteve tão furioso. Paradoxalmente, apesar de todo ódio que nutria por aqueles que o exilaram, Hulk nunca esteve tão seguro de seus atos. Toda a destruição que ele causa foi friamente pensada. E é sobre esse aparente contradição (e também sobre incontáveis batalhas e explosões) que Pak construiu sua história. Embora a HQ seja um marco importante na cronologia de Hulk, ela oferece pouco mais do que uma leitura descompromissada.

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Apesar do bom argumento, Millar peca pela falta de sutileza


Chamado no Brasil de Túnel do Tempo, Elseworlds é o selo que a DC colocava nas suas publicações que não eram alinhadas com a cronologia oficial da editora. Hoje em dia ela caiu em desuso. Foi no final dos anos 90 e início dos anos 2000 que ela teve o seu auge com obras clássicas como Gothan City 1889, Liga da Justiça - O Prego e Robin 3000. Superman - Entre a Foice e o Martelo lançado em 2003 nos EUA em três edições é outra obra de sucesso desse selo e muito ansiada pelos leitores brasileiros, que desde 2006 não a vê sendo publicada por aqui.

A força da obra começa pela sua premissa: como seria o mundo se, ao invés de ter caído nos EUA, Superman tivesse caído no território da União Soviética em plena Guerra Fria. Mark Millar então erige do zero a sua versão do homem de aço soviético, bem como todas as implicações a partir desse fato. Mas não fica só nisso, Millar também se preocupa em dar sua versão para diversos outros heróis e vilões DC a partir desse paradigma. Por trás desse plot, fica subentendido a centralidade que Superman exerce em todos os heróis da editora, como se todos gravitassem ao redor de sua influência. Isso reforça a fama do Azulão como o primeiro herói, uma vez que alterar suas origens acarreta mudanças profundas em todos os outros personagens da casa.

Vemos aqui não só o nascimento de um Superman muito mais político que o original, que se vê (ainda que a contragosto) no comando da nação. Assim vemos também o nascimento de um Batman soviético, idealizado para combater o totalitarismo do regime; de uma Mulher-Maravilha, inicialmente engajada no plano de pacificar o globo sob a batuta de Superman, mas que se transforma numa das maiores críticas do regime; e de um Lanterna Verde, comprometido com o plano de Lex Luthor em finalmente vencer a ameaça do herói de vermelho. Lex Luthor, aliás, é o grande contraponto do suposto heroísmo praticado pelo Homem de Aço. Ele aqui continua fazendo as vezes de vilão, mas seu comprometimento em derrubar o sonho megalomaníaco de controlar tudo e a todos consegue uma certa simpatia do leitor, que anseia pelos confrontos entre Lex e Kal-El.

O grande problema da obra, apesar das diversas boas sacadas que a permeiam do começo ao fim, é a falta de sutileza de Mark Millar no texto. Sua escrita é pesada e, de certa forma, espalhafatosa demais. Falta um refinamento em desenvolver os conceitos trazidos a baila e que os deixariam muito melhores. Lex, por exemplo, tem que a todo tempo ser um canalha completo, afinal ele é um vilão e precisa fazer maldades. Para demonstrar sua inteligência acima da média, Lex sempre fala que está jogando xadrez com 7 pessoas diferentes ao mesmo tempo e lê cinco livros numa manhã. Superman é um sujeito controlador, por isso Millar precisava deixar isso escancarado na cara de todos ao mostrar pessoas controladas mentalmente por um aparelho cravado no meio do crânio.

Vez ou outra, esse artifício passa até despercebido, mas ver isso sendo feito a todo momento me cansou um pouco. Pelo menos, Millar não exagerou nos clichês históricos sobre a Guerra Fria e retratou o lado soviético com justeza, sem cair na armadilha de glorificar o lado americano e esculachar o modelo soviético. É um tema até hoje espinhoso e tratá-lo sem cometer excessos exige certa habilidade.

Superman - Entre a Foice e o Martelo
Superman Red Son #1-3
**** 8,0
DC | agosto a outubro de 2003
Panini | junho de 2006
Roteiro: Mark Millar
Arte: Dave Johnson e Kilian Plunkett
Arte-final: Andrew C. Robinson e Walden Wong

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Eu li... Violent Cases

Titan Books (out/1987) | Aleph (set/2014) | Roteiro Neil Gaiman | Arte Dave McKean

É uma leitura curta, mas Violent Cases é o que podemos convencionar chamar de obra densa. Quem não ficou pelo menos tentando em ler a obra uma segunda vez talvez não tenha percebido a profundidade da obra de Gaiman e McKean. O que mais impressiona nesse trabalho da dupla é o toque de simplicidade. Não se trata de uma história mirabolante ou extraordinária. Trata-se das memórias da infância de um garoto comum diante de um acontecimento excitante, cuja real dimensão foi compreendida apenas muito tempo depois. A arte de McKean é perfeita para transmitir essa ambientação incerta, dúbia e volátil inerente à memória. Sem ela, talvez o resultado pretendido por Gaiman não tivesse sido alcançado.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Inédita no Brasil, "A History of Violence" expõe nossa fragilidade diante da violência


Na época do lançamento do filme Marcas de Violência, de David Cronenberg, eu não fazia ideia de que se tratava de uma adaptação de um quadrinho. Nem mesmo o diretor fazia ideia disso, pelo menos não até o longa receber uma indicação ao Oscar de melhor roteiro adaptado. Esse desconhecimento é bastante compreensível no Brasil, já que a obra de John Wagner (Juiz Dredd) e Vince Locke (Sandman) nunca foi aqui lançada, ao contrário de outra obra do selo Paradox também adaptada com sucesso para o cinema, Estrada da Perdição, lançada por aqui pela editora Via Lettera.

A History of Violence conta a história de Tom McKenna, um pacato dono de uma lanchonete cuja rotina é alterada drasticamente após impedir com as próprias mãos que seu comércio fosse assaltado, matando um dos bandidos e rendendo o outro. Devido a exposição do caso pela mídia, ele é reconhecido por membros da máfia de Nova York como um antigo desafeto, cujas contas ainda estão para serem acertadas.

O quadrinhos aborda bem, pelo menos no início, o quanto estamos sujeitos a ter nossas vidas transformadas do dia pela noite por eventos tão extraordinários, quanto aleatórios. Nenhum de nós está seguro suficiente para afirmar estar livre de situações bizarras como a que Tom McKenna se meteu. A introdução de John Wagner para a edição aborda justamente esse aspecto da trama: pessoas comuns apanhadas em situações extraordinárias. Ninguém está a salvo, e esse é o preço de se viver em uma sociedade tão violenta quanto a nossa.

Já a segunda parte da trama foca no elemento violência, mais precisamente nessa cadeia de atos violentos que une as mais variadas pessoas, inclusive através dos tempos. Wagner retrata esse mal como uma espécie de vírus, que passa de pessoa para pessoa e nunca para. Essa é a história de violência, algo que transcende o tempo, ao ponto de se tornar elementos formador de uma sociedade. Uma vez que você se permite ser parte agente dessa história de violência, ela vai persegui-lo pela vida toda, por mais que você sinta livre de sua influência.

O filme de Cronenberg segue outros rumos se comparado com a HQ que o inspirou, por isso, se você viu o filme, não deixe de ler a HQ. Se no filme vemos uma trama mais focada na família do protagonista, esmiuçando os reflexos dessa tragédia entre seus membros, o quadrinho preferiu trabalhar mais no embate entre McKenna e os mafiosos que buscam vingança. Mas, talvez o mais importante, leia para apreciar a fantástica arte de Vince Locke.

A History of Violence
***** 9,0
Paradox | maio de 1997
Roteiro: John Wagner
Arte: Vince Locke

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Eu li... Fury

Fury #1-6 | Marvel (nov/2001-abr/2002) | Roteiro Garth Ennis | Arte Darrick Robertson | Arte-final Jimmy Palmiotti

Depois de Hellblazer e Preacher, sabia-se o que esperar de Garth Ennis quando ele assumiu as histórias de Justiceiro e Nick Fury na Marvel no começo dos anos 2000: muito sangue e humor negro. Desde então, Fury ganhou algumas minisséries escritas pelas mãos do roteirista. Nessa mini, ele entrega uma história genérica, cuja principal proposta é somente chocar e divertir. Proposta que impactou negativamente até Stan Lee, que na época fez fortes declarações contra a violência na HQ. Para se ter uma ideia, Fury chega a estrangular um sujeito com as próprias vísceras do sujeito. Nada especialmente chocante tratando-se de Garth Ennis e Darrick Robertson, que repetiriam a parceria anos depois na HQ The Boys, da Dynamite.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Azzarello erra a mão em "Homem do Espaço"


O lançamento da mais recente parceria da dupla Brian Azzarello e Eduardo Risso (concluída na edição 37 da revista Vertigo da Panini), veio cercada de uma expectativa extra, pois a edição brasileira saiu apenas com quatro meses de diferença em relação à americana, algo bastante raro de se acontecer nos comics. Porém, Homem do Espaço não sobreviveu bem ao longo de seus nove números, decepcionando as boas expectativas que eu havia depositado nesse material.

As credenciais da equipe criativa envolvida não sugeria que assim fosse. No final das contas, podemos concluir que em Homem do Espaço, Azzarello acabou sendo Azzarello demais. Claramente o roteirista pesou a mão naquilo tudo que lhe deu reconhecimento em 100 Balas: violência, diversos núcleos de conflito e linguagem coloquial. Principalmente nesse último aspecto.

Não se pode responsabilizar a linguagem usada como o principal problema da série, mas sem dúvida prejudicou bastante. Também não é o caso de culpar a tradução para o português (que, aliás, foi muito bem feita considerando o desafio). A culpa foi do próprio Azzarello que utilizou de uma infinidade de coloquialismos e neologismos que, de tão frequentes, deixou certos diálogos excessivamente truncados. Uma vez que o leitor percebe que está gastando mais tempo para decifrar as falas do personagens do que para prestar atenção na trama, surge o sinal de alerta de que algo não está legal.

Particularmente, nem mesmo depois das edições iniciais eu me acostumei com o estilo e o problema se estendeu por praticamente por todas as noves edições. Além disso, a série padece de outros problemas igualmente prejudiciais, como o excesso de twists. O roteiro possui tantos pontos de virada que em determinado momento tudo se torna um tanto irrelevante e quase sem efeito dramático. Em várias passagens, precisei retomar páginas para me certificar que estava ciente dos rumos da história, pois de cenas vazias de sentido há várias. Creio que se a minissérie poderia se virar bem dentro de cinco edições.

No entanto, há ponto positivos a serem mencionados, como a ótima retratação futurística construída. Parece bastante crível o modo como foi ela foi desenhada por Risso, com seu estilo noir e sombrio. A arte do autor argentino continua ótima e foi o que se salvou na minissérie, As capas assinadas por Jock também são ótimas.

Homem do Espaço
Spaceman #1-9
*** 5,5
Vertigo | dezembro de 2011 a outubro de 2012
Panini | Lançado na revista Vertigo 29-37
Roteiro: Brian Azzarello
Arte: Eduardo Risso

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

COLUNA | A Tirinha Nossa de Cada Dia

Eu sempre senti que as tirinhas de jornal formassem um mundo a parte dos quadrinhos em geral. Obviamente, há diferenças entre a produção de tiras e a de histórias em quadrinhos tradicionais, que vão desde a estrutura formal até ao aspecto do conteúdo. Aquelas precisam ser muito mais concisas do que estas, por exemplo. Talvez por isso poucos autores façam tão bem a transição entre os dois meios, sobretudo se formos excluir as tiras de super-herói, que caíram em extinção há vários anos.

Mas isso não deve ser visto com demérito. Sempre fui um apaixonado pelas tiras de jornal e sinto com pesar sua iminente extinção, acompanhando a derrocada da imprensa em papel. Nas últimas décadas, o espaço destinado a esse tipo de conteúdo tem diminuído cada vez mais, de forma que experiências como a proporcionada por Bill Watterson em Calvin e Harold nas páginas de domingo são quase impraticáveis no momento. A esperança é que a produção para internet se consolide e abra as portas para grandes materiais.

Na última década podemos ver alguns ótimos projetos nesse sentido. O primeiro exemplo que me vem a mente é Malvados, de André Dahmer, cujo sucesso foi tanto que o jornal Folha de S. Paulo passou a publicá-la na sua, cada vez mais minguada, coluna de tirinhas. Talvez sentindo a mudança dos tempos, artista há muito estabelecidos no cenário brasileiro, como Adão, Laerte e Fernando Gonsález passaram a focar na publicação na internet e em álbuns físicos.

É com esperança e expectativa que acompanho essa transição do meio de publicação das minha tão amadas tiras. Mas é com certo pesar que imagino um futuro onde não poderei acompanhar tiras tão queridas, como Mafalda, Hagar, Piratas do Tiête e Turma da Mônica em papel jornal. Era uma experiência quase sensitiva a que eu tinha com o jornal impresso e esses quadrinhos: o cheiro do papel, a sua textura, o som das folha sendo dobradas. Conferir logo de manhã a folha de quadrinhos era uma tradição minha e que pavimentou o meu caminho para os quadrinhos em geral. Enfim, como eu disse, trata-se de algo bem particular e que talvez poucas pessoas sintam o mesmo.

Certo é que os tempos mudam e novas experiências tomarão espaço, novas tiras serão produzidas e as antigas não serão esquecidas. Há também o risco disso tudo que escrevi acima ser só mais um devaneio de alguém que é mais rabugento do que deveria, afinal, os jornais continuam aí e os bons quadrinhos também. Vida que segue.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Eu li... Arzach

Arzach | Les Humanoides Associés | Nemo (jul/2011) | Roteiro e Arte Moebius

Moebius já era um autor consagrado quando decidiu levar sua carreira a um novo patamar. Arzach consistiu num dos primeiros passos do autor rumo a uma pegada mais autoral, distante do gênero mais popular pelo qual se consagrou, o faroeste, mais precisamente por Blueberry, faroeste pelo qual trabalhou por muitos anos. O álbum consiste em algumas historietas publicadas pela Métal Hurlant em 1975 e que são unicamente escoradas em sua arte, já que Moebius as concebeu sem diálogo algum, contando apenas com o plano gráfico para desenvolver sua narrativa. A propósito, a história foge totalmente do convencional, já que o autor francês faz questão de privilegiar as sensações em detrimento da razão.


domingo, 31 de janeiro de 2016

Em obra autobiográfica, Crumb expõe seus demônios internos


Se você chegou até aqui, então Robert Crumb não lhe é um completo desconhecido. Mas se por um acaso você ainda não sabe muito sobre esse grande artista, basta ler Minha Vida, seu álbum autobiográfico, para conhecer a fundo as principais fases de sua vida e carreira. O leitor de primeira viagem, contudo, fique de sobreaviso, pois o primeiro contato através dessa obra pode ser chocante.

Em Minha Vida, Crumb destila todo o seu estilo sinistro e bizarro que lhe rendeu a fama de maior expoente dos quadrinhos underground americano. O álbum alterna passagens em forma de quadrinhos (em que o próprio Crumb é o seu personagem principal) e outras em que ele próprio conta, textualmente, alguns momentos importantes de sua vida. É aí que talvez esteja a maior qualidade do álbum, pois esse estilo despojado e sincero também é marca de seu texto, proporcionando muitas risadas e até reflexões. 

Seu início de carreira, as experiências com drogas, o conflito com o entretenimento de massa são alguns pontos abordados em seus textos. Crumb realmente não fez concessões quando decidiu colocar sua vida no papel. Não deixou de colocar os momentos embaraçosos, ridículos ou depreciativos de sua vida. Sua arte não comporta autoindulgência nem moralismos. Ele não espera a compreensão do leitor, muito menos espera sua aprovação.

No início afirmei que a edição é ótima para conhecer mais sobre Crumb, contudo ela não é a mais indicada o primeiro contato com o autor, sob pena dela não ser apreciada completamente. Para aquele que quiser se começar a conhecer a sua obra, creio que o melhor seja começar por álbuns como Fritz, The Cat e Zap Comix (ambos também lançados pela Conrad), que, por coincidência ou não, compilam trabalhos da fase inicial do autor.

Robert Crumb, certamente, não é para todo mundo. O seu humor negro, sarcástico e sem barreiras pode encontrar muita resistência em alguns apreciadores de quadrinhos. Mas para os fãs de sua obra, o álbum é obrigatório tanto para conhecer mais da mente por trás do traço quanto para conhecer alguns materiais raros do autor.

Minha Vida
**** 7,5
Conrad | 2010 (2ª edição)
Roteiro e Arte: Robert Crumb

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Eu li... Wolverine: Logan

Logan #1-3 | Marvel (mai-jul/2008) | Panini (mai/2009) | Roteiro Brian K. Vaughan | Arte Eduardo Risso | Cores Dean White

Em Logan, Vaughan e Risso voltam às origens do personagem para contar um momento importante de sua história: a sua participação nas batalhas da Segunda Guerra Mundial. A minissérie vem reforçar a identificação do personagem com o Japão, elemento esse já completamente integrado ao seu background. O diferencial dessa história está em revelar um novo amor de Logan no país (que na época ainda não era o X-Men Wolverine). Não se trata de Mariko, por quem ele se apaixonou dentro do universo regular. Como o selo Knights não integra a cronologia oficial do personagem, Vaughan se sentiu a vontade em criar esse novo romance. O resultado é uma boa história que alia perfeitamente ação e drama.

domingo, 24 de janeiro de 2016

Jeff Lemire propõe viagem através do tempo e do espaço em "Trillium"


Após concluir o ótimo Sweeth Tooth no início de 2013, Jeff Lemire logo emplacou outro trabalho no selo Vertigo. Dessa vez em um projeto totalmente diferente da obra que o precedeu. Enquadrar Trillium como uma epopeia espacial é mostrar apenas um prisma da obra, pois Lemire desceu muito a fundo nos conceitos clássicos de ficção científica, conseguindo resultados muito interessantes, sobretudo se considerarmos que se trata de uma minissérie de apenas oito edições.

Trillium acompanha a história de duas pessoas, Nika e William, separados temporalmente por mais de dois milênios de história, mas misteriosamente ligados por algum vínculo cósmico. Nika é um dos poucos sobreviventes da raça humana em 3797, que vem sendo perseguida por vírus mortal com potencial para dizimar o restante da humanidade. A última esperança se encontra no potencial curativo de uma planta chamada Trillium, somente encontrada aos pés de uma pirâmide ocupada por uma isolada tribo. Por outro lado, William é um explorador do ano de 1921, que procura na floresta amazônica peruana um mitológico templo Inca.

Enquanto Nika tentava estabelecer contato com a tribo, ela é provocada pelos nativos a ingerir o Trillium e entrar no templo, fato que a mandou de volta no tempo, direto para o templo Inca na Amazônia em 1921, dando de cara com William. A partir desse momento, o destino deles irremediavelmente se unem, ao passo que as ações de um passam a provocar consequências no outro.

O entrelaçamento entre os destinos de Nika e William não ficou apenas no aspecto do conteúdo. Jeff Lemire, flertando com o experimentalismo, trabalhou também a forma, de modo que os quadros e as páginas refletem esse aspecto do enredo. A primeira edição, por exemplo, é um flipbook que possui duas capas (uma com Nika em destaque; outra, com William). O leitor pode começar a ler a história por qualquer sentido, sem prejuízo de entendimento.

Na terceira edição, as páginas que conta a história de Nika estão no sentido comum, enquanto as de William ficam de ponta-cabeça, precisando o leitor virar o livro para continuar lendo. Na quinta edição, a parte de cima da página conta a história de Nika, a metade de baixo, de ponta-cabeça, a de William. Toda essa inusitada disposição dos quadros vem enriquecer ainda mais um roteiro já bastante experimental. Não é propriamente uma técnica original conduzir o leitor a uma imersão na forma (Monstro do Pântano de Alan Moore está aí pra demonstrar), mas é alvissareiro perceber que ainda há autores dispostos a experimentar dentro dos quadrinhos mainstream.

Nesse ponto da carreira, Jeff Lemire demonstra não só sua versatilidade nos desenhos (todos lindos), como a sua disposição em experimentar. Em muitos momentos, Trillium apresenta uma trama hermética, de difícil assimilação. Contudo, se o leitor se permitir abstrair alguns conceitos e embarcar na proposta de Lemire, a viagem terá tudo para ser gratificante ao final.

Trillium
Trillium #1-8
**** 8,0
Vertigo | outubro de 2013 a junho de 2014
Roteiro e Arte: Jeff Lemire

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Eu li... Moon Knight Vol. 2 - Dead Will Rise

Moon Knight #7-12 | Marvel (nov/ 2014 - abr/2015) | Roteiro Brian Wood | Arte Greg Smallwood e Giuseppe Camuncoli

Depois do ótimo arco escrito por Warren Ellis, a Marvel manteve o nível de excelência do título ao escolher Brian Wood como roteirista. Seguindo os passos do escritor inglês, Wood jogou luz sobre o peculiar relacionamento de Marc Spector e a deidade Konshu, que habita a mente do herói. Não sou particularmente versado na mitologia do Cavaleiro da Lua, por isso me pareceu bastante esclarecedoras algumas passagens em que o herói lida com as diversas facetas de sua personalidade em suas missões. No geral, esse run de Wood tem um ritmo menos frenético do que o do Ellis, mas o foco em certos experimentalismos se manteve, como na história ilustrada somente com displays de câmeras que registravam os acontecimentos.

domingo, 17 de janeiro de 2016

Focando na nova geração de leitores, Pope se espelha em heróis clássicos

Bom de Briga, de Paul Pope - Quadrinhos na Cia

Se eu li um gibizinho gostoso de ler e divertido em 2015 foi Bom de Briga, de Paul Pope (Batman - Ano 100). E esse nem é um daqueles casos em que a gente vai conferir alguma obra sem nenhuma expectativa e, no final, acaba sendo surpreendido. Ao contrário, Bom de Briga, desde que foi lançado, vem angariando boas críticas, o que contribuiu para que eu alimentasse certa expectativa sobre sua qualidade. Expectativas, diga-se, plenamente correspondidas, pois Pope conseguiu em cerca de 200 páginas não só contar uma boa história, como também erigir do zero um universo próprio e bastante promissor.

O quadrinho conta a história de um jovem deus (aqui na Terra apelidado de Bom de Briga) que, ao completar 12 anos, precisa passar por um ritual chamado de incursão, por meio do qual ele deve testar suas habilidades e se provar digno de sua condição. Para tanto, ele é enviado para a cidade de Arcópolis, há muito tempo sitiada por monstros e que acaba de perder as esperanças depois da morte de seu mais proeminente herói, Haggard West.

Trata-se de uma história divertida muito por conta da habilidade narrativa de Pope. Seus desenhos, seus diálogos são fluído e cativantes, como há muito tempo não vejo num quadrinho da DC ou da Marvel, que possuem um know-how quase secular de contar histórias de super-heróis. Pope trouxe um frescor pro gênero que só quem almeja o público infanto-juvenil tem conseguido nos últimos tempos.

Esse é outro aspecto a se comentar: o público alvo. Embora trata-se de um gibi dirigido majoritariamente ao público infanto-juvenil (de 13 a 17 anos), Bom de Briga é capaz de cativar o leitor de longa data, não só em razão da sua incontestável qualidade, mas porque Pope se vale de elementos já explorados pelos super-heróis clássicos. Por exemplo, o uso da mitologia como fonte dos super poderes e a relação entre pai e filho deuses. Não é preciso muito esforço para relacionar esses elementos ao que Thor já fez muito bem durante toda a história. Só que Bom de Briga traz mais: atualiza vários conceitos, conversa com a nova geração de leitores ao se apegar a um ritmo despojado e frenético de narrativa. 

Pope preza pelas cores quentes e enquadramentos dinâmicos para imprimir ação em suas cenas, tudo isso temperado com o carisma dos personagens. A leitura, assim, se desenvolve fluída e rapidinho chega-se ao final da HQ, que, infelizmente, não tem sua trama concluída. Pope já está trabalhando na continuação, além de já ter lançado outra obra que se passa no mesmo universo (The Rise of Aurora West), onde conta as origens da família West. Pena só que Pope tem sido bem lento.

Bom de Briga
Battling Boy
***** 9,0
First Second | 2013
Quadrinhos na Cia | julho de 2014
Roteiro e arte: Paul Pope

domingo, 10 de janeiro de 2016

Jessica Jones: Força e Sensibilidade

Essa resenha é a primeira participação especial de Janaina Cota aqui no blog. Além de minha namorada, ela é uma grande fã tanto dessa série quanto da personagem Jessica Jones.


O universo dos quadrinhos nos últimos vem ganhando uma atenção especial em séries e filmes. É cada vez mais corriqueira a presença de personagens dos quadrinhos em cartazes e chamadas de lançamentos. A popularidade destes é crescente, e a indústria, a fim de conseguir ainda mais seguidores e manter os fãs atuais, está aprofundando em personagens secundários e outros há muito perdidos nos anos. Jessica Jones, do quadrinho Alias, é um exemplo desse fenômeno.

Após a criação do seriado (com título de mesmo nome da personagem), lançado pela Netflix, essa heroína conhecida por poucos ganhou especial atenção, gerando admiradores e algumas polêmicas a respeito da moça. Jessica Jones é apresentada em seu quadrinho como detetive da Codinome Investigações, criado por ela após desistir da carreira de heroína, quando se autodenominava Safira. Orfã, de aparência desleixada, modos grosseiros e aparentes problemas com cigarro e bebida, ela foi adotada por uma boa família. No entanto, a história da moça vai muito além dessa visão inicial. O desenrolar da história e os encaixes são simplesmente geniais, com direito a aparições de Luke Cage, Matt Murdock (Demolidor), J. Jonah Jameson, Peter Parker (Homem Aranha) e Dr. Octopus. 

Retomando: no primeiro capítulo já notamos a personalidade forte da jovem, as dificuldades de falar sobre seu tempo como heroína e o vazio de sentimentos, facilmente notado na cena de sexo com Luke Cage, seu amigo, quando revela sua necessidade de sentir algo, não importando o quê. Durante algumas de suas investigações ao longo da HQ, ela conhece outras pessoas, dentre eles um policial de uma pequena cidade, onde se envolvem em um romance rápido, e deparamos com o preconceito dele em relação a personagem, simplesmente pelo medo do diferente. E por conseguinte, envolve em uma relação com o super-herói, Homem Formiga, apresentado pela sua antiga colega, e também heroína, Carol Danvers (Miss Marvel). Esse romance não viria a durar, pois uma notícia mudaria a vida dos dois personagens. 

Outra peculiaridade da nossa amada heroína é força de superação, principalmente ao tratar do seu principal vilão, o Homem Púrpura, cujo poder de liberar hormônios o permite controlar a mente da vítima. O cruel Homem Púrpura com esse seu poder de controlar, manteve Jéssica Jones presa por meses e cometeu abusos contra a moça, forçando ela a amá-lo enquanto ele a desprezava por divertimento. Jéssica chora com Luke Cage ao contar sua história, enquanto lida com o pânico de enfrentar o Homem Púrpura novamente. O destino cuidou disso, e logo vemos Jéssica em ação, mostrando coragem de lidar com seus sentimentos, com toda a força que a personagem possui.

Jessica Jones se mostrou uma personagem madura, forte e direta, uma mulher com sentimentos e problemas como qualquer outra pessoa. Ela trouxe uma visão real do que vivemos, as dificuldades enfrentadas pelas pessoas especiais e os abusos sofridos, seja nas relações e conflitos pessoais, seja lidando com as perdas e sofrimentos oriundos das responsabilidades e das escolhas que fazemos. Por trás desse contexto, revela-se que todos super-heróis tem uma história, possuem família e, tendo superpoderes ou não, lidam com os mesmo problemas, conflitos e desejos que nós. Essa visão dos problemas humanos são abordados de forma maravilhosa e os traços do quadrinho não poderiam ser mais expressivos. É por essas e por outras que Jéssica Jones é um ícone.

Alias
Alias #1-28
***** 10
Marvel | novembro de 2001 a janeiro de 2004
Panini | agosto de 2010 (compreende #1-9)
Roteiro: Brian Michael Bendis
Arte: Michael Gaydos

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Melhores de 2015 | Lista Geral

Para maiores detalhes sobre os "vencedores" é só clicar no link de cada categoria!

Melhores roteirista
- Alan Moore (A Saga do Monstro do Pântano)
- Neil Gaiman (Sandman e Violent Cases)
- Robert Kirkman (The Walking Dead)

Melhores artistas
- Brian Bolland (Camelot 3000)
- Hugo Pratt (Corto Maltese - A Balada do Mar Salgado)
- Winshluss (Pinóquio)

Melhores coloristas
- Elizabeth Breitweiser (Fatale)
- Juanjo Guarnido (Blacksad: Amarillo)
- Laura Martin (Os Surpreendentes X-Men e O Ministério do Espaço)

Melhores capistas
- Brian Bolland (Camelot 3000)
- George Pérez (Crise nas Infinitas Terras, Os Novos Titãs e Mulher-Maravilha)
- John Cassaday (Os Surpreendentes X-Men)

Melhores álbuns
- Corto Maltese - A Balada do Mar Salgado
- Pinóquio
- Violent Cases

Melhores séries regulares
- A Saga do Monstro do Pântano
- Os Surpreendentes X-Men
- The Walking Dead

Melhores minisséries
- Camelot 3000
- Fashion Beast - A Fera da Moda
- Reino do Amanhã

Melhores arcos
- O Contrato de Judas (Tales of The Teen Titans #42-44e Tales of The Teen Titans Annual/1984)
- Destroçados (Astonishing X-Men #13-18/2006)
- Gótico Americano (The Saga of Swamp Thing #37-50/1985-86)

Melhores edições únicas
- A Saga do Monstro do Pântano #21 - Lição de Anatomia
- Sandman #75 - A Tempestade
- Astro City #4 - Proteção

Melhores capas
- Crisis on Infinite Earths #7/1985 - Por George Pérez
- Astro City #4/1995 - Por Alex Ross
- Camelot 3000 #8/1983 - Por Brian Bolland