quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Irrepreensível em sua primeira metade, Skreemer decepciona em sua parte final


Skreemer está longe de ser uma obra muito conhecida no Brasil, sobretudo se levarmos em conta seu histórico de publicação no país. Depois de sua publicação em seis edições avulsas em 1990 pela Abril (e que no ano seguinte foi lançadas encadernadas), somente a Brainstorm a lançou novamente, só que num formato totalmente equivocado, em preto-e-branco e com preço proibitivo. Resultado: pouca gente chegou a ler a minissérie. Foi por sorte minha e descaso do grande público que consegui achar as edições da Abril em um sebo, todas em ótimo estado e num preço imperdível. Nem pestanejei em comprar.

É muito curioso que uma obra tão diferenciada como Skreemer seja tão pouco referenciada. Deu-me a impressão que Peter Milligan quis fazer uma de suas obras definitivas logo no início de sua carreira nos EUA, tamanha a grandiosidade de sua história. Ela se passa num Estados Unidos distópico, esfacelado por tumultos civis que fizeram que o poder institucionalizado se dissolvesse, dando espaço para que as guangues assumissem o controle. A miséria se proliferou, e o único modo de levar uma vida longe dela era se adaptando ao sistema. Veto Skreemer é filho dessa nova era, e se tornou o seu maior expoente.

Skreemer se inicia com o prenúncio do fim dessa era. Enquanto o velho mundo resiste a mudança de paradigmas, acompanhamos o passado tanto de Veto como o da família Finnegan, que simboliza a resistência dos valores morais em meio a um mundo corrompido. Toda a narrativa é entrecortada entre passado e presente, entre os Finnegans e Skreemer. Essa intercalação narrativa é intensa, mas extremamente natural e oportuna, de modo que ela, de fato, acrescenta valor a obra e auxilia na compreensão das motivações dos personagens.

O primeiro número da série, "Almas para o Demônio", é quase perfeito. E o nível praticamente se mantém em sua primeira metade. Pena que a história tenha perdido o foco na metade final ao adicionar elementos sobrenaturais e improváveis. Aquele tratamento realista e cru dos primeiros números, que refletia a miséria do mundo em que a trama está inserida, deu lugar a desdobramentos improváveis, quebrando um pouco um pacto que havia estabelecido com a história. Isso ocorreu, principalmente, com o plano dos balões. Essa talvez tenha sido a intensão de Milligan desde o início: quebrar expectativas e reafirmar o livre arbítrio independentemente de nosso passado.

Peter Milligan estava apenas assinando as suas primeiras obras para o mercado americano de quadrinhos quando concebeu Skreemer para a DC em 1989 (hoje, a obra compõe o catálogo da Vertigo). Antes dela, Milligan tinha feito carreira dentro da 2000 AD e, nos EUA, em alguns títulos isolados da Quality Comics e Vortex Comics. Com Skreemer, porém, a projeção foi de destaque e ele, enfim, se tornou um nome conhecido na indústria, tanto que, logo em 1990, ele já estava a frente dos roteiros de Shade, The Changing Man, também pela DC, título que se manteve a frente por todas as suas 70 edições.

Skreemer #1-6
**** 8,0
DC Comics | maio a outubro de 1989
Abril | setembro a outubro de 1990
Roteiro: Peter Milligan
Arte: Brett Ewins e Steve Dillon
Cores: Tom Ziuko

Nenhum comentário: