domingo, 27 de julho de 2014

Apesar de supervalorizada, Preacher é leitura obrigatória


Um golias foi vencido. Finalmente, depois de muita aporrinhação alheia, conclui a leitura de Preacher. A obra máxima de Garth Ennis e Steve Dillon é concluída com o último arco de sete partes, "Alámo", e a edição final de 50 páginas. É certo que é uma das histórias mais divertidas que li, mas certamente não entra com louvor no meu panteão da nona arte, ao lado de obra como Sandman, Watchmen e Asterious Polyp (só pra citar um fora do rol tradicional).

Ao longo das suas 66 edições a série perde um pouco o foco, indo se recuperar nos números finais, mas ainda assim nada excepcional. Isso não impede de eu escolher a edição 54 ("Eu Construí Meus Sonhos ao Seu Redor") dentre as minhas favoritas de todos os tempos. A propósito, a relação Jesse-Tulipa é outra das coisas mais legais que eu já li. A química que foi construída entre os dois é fantástica. Chega a ser tocante em muitas passagens.

Ennis foi bastante habilidoso ao construir seus personagens. O grande forte da série é justamente esse. Mas creio que o seu argumento é falho em muitos momentos, sobretudo após o divisor de águas no meio da série (o leitor já deve imaginar qual passagem estou me referindo). Desse jeito, a série perdeu o ritmo alucinante que vinha tendo até então e patinasse por algumas edições. Em "Álamo", o desfecho dado para o núcleo de Salvation (que, como um todo, não me agradou) foi apressada.

Apesar de tudo, o saldo final da leitura de Preacher é altamente satisfatório, valendo a leitura de cada número. Só acho exagerada a idolatria que cerca a série hoje em dia.

Preacher - Série Completa
Preacher #1-66
**** 8,5
Vertigo | 1995 a 2000
Roteiro: Garth Ennis
Arte: Steve Dillon
Cores: Matt Hollingworth e Pamela Rambo

sábado, 26 de julho de 2014

"Origem Secreta" derrapa em roteiro raso e manjado


A princípio, um gibi do Lanterna Verde intitulado Origem Secreta é uma boa porta de entrada para leitores não familiarizados com o super-herói. Correto? A primeira vista, sim. Afinal, além do sugestivo título, a premissa da HQ dá conta sobre como Hal Jordan, piloto de avião indisciplinado e com sérios problemas familiares, se tornou o Lanterna Verde.

Eu busquei a leitura deste arco escrito por Geoff Johns e Ivan Reis justamente para pegar mais traquejo com a mitologia do herói antes de me aventurar em outras de suas famosas histórias. Mas ocorre que, apesar do calibre da dupla criativa, Origens Secretas não empolga e oferece uma aventura muito aquém do potencial do personagem, nem mesmo até da consagrada passagem de Johns (que durou mais de seis anos).

Cheio de clichês e esteriótipos (principalmente sobre a rotina militar), a proposta da HQ parece ser somente oferecer um entretenimento descompromissado ao leitor sem ousar demais. Além do mais, a história já sofria com um dos principais problemas das histórias da DC atualmente: superficialidade das suas tramas. Os defensores dirão que se trata de uma forma de captar novos leitores, não familiarizados com o Universo DC. Ocorre que o problema é narrativo, e não propriamente de ideias.

Pra piorar, o arco do encadernado da Panini fica inconclusivo quanto a uma parte da história, e o restante não foi lançado. Pelo menos não ainda no formato encadernado.

Lanterna Verde - Origem Secreta
Green Lantern #29-35
*** 5,5
DC | 2008
Panini | julho de 2011
Roteiro: Geoff Johns
Arte: Ivan Reis
Arte-final: Oclair Albert e Júlio Ferreira
Cores: Guy Major

sábado, 19 de julho de 2014

Gotham Central mostra que não é só de Batman que vive o batuniverso


Gotham City é muito mais que somente a cidade do Batman. É com base nessa premissa simples, porém genial, é que a série Gotham Central (Gotham City Contra o Crime) constrói sua trama. Para quem não conhece, a série narra a rotina dos detetives da Unidade de Crimes Hediondos na cidade que talvez tenha os maiores índices de criminalidade da ficção, que, por ocaso ou não, é a mesma cidade do Batman ("quem veio primeiro: os pinéis ou o Batman"). 

Brubaker e Rucka são muito hábeis ao usar da mitologia do batuniverso sem, contudo, serem apelativos demais. Ou seja, não fazem do Batman uma muleta. Não, Gotham Central tem seus próprios heróis, mais reais, humanos. Desconsidere a pieguice, mas os policiais de Gotham, ao seu estilo, se revelam a altura do heroísmo do Homem-Morcego. É nesse contraste que se encontra boa parte da força da série. Esse argumento da HQ é tão bom que vai passar a ser usado na nova série de TV Gotham.

Para mim, Michael Lark desenha Gotham como ninguém, apesar de não se o melhor artista que já desenhou Gotham (há uma substancial diferença aqui). O lápis pesado do desenhista casa perfeitamente com a ambientação sombria da cidade, fazendo com que os prédios, becos e ruas sejam quase um personagem ativo na série. Ele sempre está ali, ao fundo da cena, marcando presença indispensável.

DC Especial #13 - Gotham City Contra o Crime Vol. 4
Gotham Central #19-25
**** 8,0
DC | julho de 2004 a janeiro de 2005
Panini | março de 2007
Roteiro: Ed Brubaker e Greg Rucka
Arte: Michael Lark e Stafano Gaudiano
Cores: Lee Loughridge

quarta-feira, 16 de julho de 2014

"Os Livros da Magia" é uma viagem sensorial nos quadrinhos


Talvez mais do que em outras mídias, como cinema, música e até mesmo literatura, a velocidade de leitura de um quadrinho não pode ser estipulada de acordo com o seu tamanho (considerada em seu sentido físico). O agravante dos quadrinhos é que há a arte para apreciar. Ao lado do texto, a arte trabalha intensamente em transmitir significado, de forma que muitas vezes ela demanda mais reflexão e cuidado em sua percepção em umas obras do que em outras. Sem esse cuidado, a leitura pode se transformar em um desastre.

Isso tudo é plenamente verificável durante a leitura de Os Livros da Magia, obra de Neil Gaiman e quatro talentosíssimos ilustradores, que merecem citação expressa: John Bolton, Scott Hamptom, Charles Vess e Paul Johnson. São eles os destaques da obra. E não é pouca coisa um artista de quadrinhos chamar mais atenção que um roteiro de Neil Gaiman. A magia da obra é toda deles.

A viagem de Timoty Hunter e da Brigada dos Encapotados pelos mundos da magia talvez seja o mais próximo que uma HQ pode chegar de uma viagem sensorial. A HQ não é verborrágica, é imagética, fazendo com que a leitura fique mais complexa, mais rica. Tanto é assim que não é pouco comum passagens que comportam mais de uma interpretação. Coisa que, convenhamos, não tem sido algo comum de se ver nos quadrinhos atuais. Talvez aí se encontre outro motivo para uma leitura mais devagar da obra, pois provavelmente você não terá coisa muito melhor para ler.

Os Livros da Magia
Books of Magic #1-4
**** 8,0
DC | 1990-1991
Panini | agosto de 2013
Roteiro: Neil Gaiman
Arte: John Bolton, Scott Hamptom, Charles Vess e Paul Johnson.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

O horror sci-fi chega às histórias policiais da dupla Brubaker-Phillips


Muitas dúvidas e poucas certezas. É assim que o leitor se sente ao terminar o Volume 1 (#1-5) de Fatale, o mais novo trabalho da dupla Brubaker e Phillips (que já trabalharam juntos em séries como Criminal e Incognito, que, a propósito, não li nenhum). Dessa vez na Image, a série não é apenas outra história policial. Vai além disso. Dessa vez a dupla insere um elemento um tanto inusitado dentro do gênero: horror sci-fi (com monstros). 

Dessa vez, o tom adulto da trama se deve a alta carga de ocultismo e magia negra presente em suas páginas. A pegada policial é apenas tangencial a trama, sendo o que realmente está em destaque é o mistério sobre Josephine, que aparentemente é a mesma nos anos 50 e nos dias atuais, quando mantém relações tanto com Hank Raines quanto com o seu neto, Nicholas Lash. O rastro de destruição e dor causada por sua presença é elementos presente em ambas as épocas e percorre as gerações.

Falar mais do que isso seria mera especulação, Brubaker e Phillips se limitam nesse primeiro arco apenas a lançar as bases de sua história, de forma a fisgar irremediavelmente o leitor, que cada vez mais se enlaça nas dúvidas que surgem no decorrer das edições. Qualquer palpite sobre o que está acontecendo tem grandes chances de estar fadada ao erro.

Apesar de não ser exatamente empolgante nas primeiras edições, é fato que Fatale tem o mérito de fazer o leitor querer continuar lendo, uma vez que o arco inicial aparentemente nem arranha a dimensão que a trama pretende alcançar. Promissora desse jeito, a série não é para ser ignorada.

Fatale, que atualmente está em sua 23ª edição nos EUA, ainda está inédita no Brasil. Para quem sabe ler em inglês, as edições estão disponíveis para venda na Comixology (clique aqui). 

Fatale: Volume 1 - Death Chases Me
Fatale #1-5
**** 7,5
Image | junho de 2012
Roteiro: Ed Brubaker
Arte: Sean Phillips
Cores: Dave Stewart

terça-feira, 8 de julho de 2014

O maravilhoso mundo de Vaughan e Staples continua sedutor


Finalizado o Volume 3 de seu TP, Saga continua muito bem, obrigado. O terceiro arco da série expandiu os núcleos dramáticos, sem deixar de centrá-los dentro de um plot coeso. Claro que com esse acréscimo no número de personagens (como Gwendolyn, Heist e os repórteres investigativos) os personagens passaram a concorrer por espaço dentro das edições, mas isso não significou em tramas má desenvolvidas, sobretudo em razão deles todos estarem convergindo para um mesmo ponto. Vide o desfecho da edição 18.

A impressão que passa (um pouco exagerada, reconheço) é que qualquer personagem que Vaughan inserir na história vai se encaixar naturalmente a trama e transmitir empatia ao leitor. Brian K. Vaughan, como de costume, continua ótimo nos roteiros, mas é Fiona Staples quem está surpreendendo. De seu trabalho, não se deve esperar nada menos do que um casamento perfeito entre a arte e as cores, quesito que mais me impressionou neste arco. O contraste entre locares extremamente coloridos e desolados (como era o planeta onde Heist residia) dava uma boa dimensão do trabalho que as cores desempenham ao retratar o mundo de Saga.

E o final do arco, após o qual a série entrou num hiato nos EUA (já terminado), aparentemente é o final de uma fase da série, que continuará após um salto temporal significativo. Se tratando de Saga, as expectativas para o novo arco estão nas alturas.

Saga #13-18
***** 9,0
Image | agosto de 2013 a janeiro 2014
Roteiro: Brian K. Vaughan
Arte e cores: Fiona Staples

segunda-feira, 7 de julho de 2014

A arte de Chis Weston impressiona em HQ inglesa


Continuando a proposta de trazer material da revista 2000 AD para o Brasil, a Mythos lançou recentemente o inédito Juiz Dredd Apresenta: A Lei de Canon. Trata-se de um dos primeiros trabalhos de Mark Millar nos quadrinhos, antes de iniciar trajetória no mercado norte-americano de quadrinhos, onde fez sucesso sobretudo nos títulos da Marvel. E aqui já é possível identificar o seu potencial para histórias de ação.

O quadrinho conta a história de Canon, um agente da patrulha paroquial, que atua numa Londres distópica, onde o crime e a violência é generalizada. Cabe a Canon levar a "justiça divina" contra os pecadores. Como se pode perceber pelas linhas gerais do título, o roteiro não é lá muito sofisticado, justamente em razão do fato de essa não ser mesmo a sua proposta. 

Escorado na maravilhosa arte de Chris Weston (artista que não conhecia até então), Millar e, na segunda parte da revista, Kew-W se preocupam em colocar Canon sempre no meio da ação. E é nesses momentos descompromissados é que A Lei de Canon consegue divertir. 

Garantindo o investimento feito (pesados R$ 16,90) e demonstrando que o inglês é um artista fantástico, os painéis de Weston são de admirar. O nível de detalhamento da arte é de impressionar, fazendo com que a leitura de toda a revista, que não demandaria nem uma hora, se prolongue por mais tempo. Pena que suas contribuições nos quadrinhos americanos (cujo acesso seria mais fácil) tenham sido restritas a apenas alguns títulos (como The Filth, com Grant Morrison).

Juiz Dredd Apresenta: A Lei de Canon
Canon Fodder
*** 6,5
Rebellion | 1993
Mythos | maio de 2014
Roteiro: Mark Millar e Kew-W
Arte: Chris Weston

sábado, 5 de julho de 2014

Série comemorativa dos 75 anos de Batman surpreende por não decepcionar


Batman Eternal é o principal evento comemorativo dos 75 anos de criação do Homem-Morcego. A proposta é semelhante a algumas já empreendidas pela DC, como a maxissérie 52 (lançada em 2006). Por isso, de início, torci o nariz para a série, pois é quase impossível, ainda mais levando em conta o atual estado criativo da editora, manter a qualidade por tanto tempo. Sem contar o fato de que, por ser uma série semanal, o prazo para a produção é escasso.

Sob a batuta de Scott Snyder, Batman Eternal teve um bom começo apesar de tudo. O plot inicial é a suposta má conduta do Comissário Gordon, que teria atirado a sangue frio contra um criminosos desarmado e causado um grande desastre no metrô. A partir daí, Batman passa a investigar o ocorrido tentando inocentar um dos seus principais defensores.

Se o roteiro de Snyder (que tem a contribuição de James Tynion IV e John Layman) é dos pontos fortes da série, o mesmo não se pode dizer da arte, que sofre com o fato de ser semanal. A alteração de desenhistas é constante. E pior, de artistas com características muito diferentes, chegando ao absurdo de prejudicar a identificação dos personagens de uma edição para a outra.

Se corresponder às expectativas geradas nessas primeira edições e superar os problemas da arte, Batman Eternal pode trazer uma contribuição relevante ao universo do herói.

Batman Eternal #1-5
*** (6,5)
DC Comics | junho e julho de 2014
Roteiro: Scott Snyder, James Tynion IV, John Layman e outros
Arte: Jason Fabok, Andy Clarke, Dustin Nguyen e Derek Fridolfs

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Júlia apresenta um estilo próprio dentro do gênero policial


Apesar de não ser tão badalada quanto os seus congêneres italianos como Tex e Ken Parker, Julia apresenta desde as suas primeiras edições um patamar elevado de qualidade. Giancarlo Berardi estreou um dos seus mais famosos títulos com um arco de três edições apresentando uma história poderosa.  Em Júlia #1-3, Berardi apresenta não só sua personagem principal, mas também um de seus mais marcantes personagens: Myrna.

Ao estilo dos quadrinhos italianos, Berardi apresenta em cada edição uma história fechada. Mas nessas três primeiras edições, ele opta centrar o suspense sobre Myrna, o perfeito contraponto à criminóloga. Aqui, ele lança as bases dos personagens e dita o tom da maioria das tramas que viriam a seguir. Sem qualquer pretensão de rebuscamento ou sofisticação, J. Kendall apresenta bons roteiros e que, além de divertir, dá exemplo de como se deve se conduzir um roteiro.

Júlia tem seu método próprio de trabalho, que é diferente de outros detetives da literatura, como Poirot e Maigret. Ela tem um modo particular de conjugar o conhecimento acadêmico com a curiosidade própria dos investigadores tradicionais. Para os apreciadores de histórias policiais, J. Kendall é leitura obrigatória.

Julia #1-3
***** 8,5
Bonelli Comics | 1998
Mythos | 2005
De Giancarlo Berardi (roteiro) e Luca Vannini, Corrado Roi e Gustavo Trigo